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Claúdio Salles

Claúdio Salles

Disponibilizamos, aqui no site do INCT INEAC, o edital do IV ENCONTRO DE PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS DA UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA - UVA, que vai se realizar entre os dias 16 e 18 de outubro de 2019, no campus Tijuca das 9h às 18h.

Para conferir o edital faça abaixo o download no PDF anexo .

 

 

 
 

Acontecerá nos próximos dias 29 e 30 de agosto, no Auditório do Bloco O do Campus Gragoatá da UFF, em Niterói, RJ, o II Seminário Sobre Raça e Política no Brasil. Pesquisadores vinculados ao INCT-INEAC participam da atividade. 

Confira abaixo a programação do evento:

- Bloco O - Auditório - Campus Gragoatá - Niterói, RJ.

➡Abertura: 10:30h – organização do evento

➡Mesa 1:
11:00 - 12:30 Igualdade racial e relações internacionais

Giovana Zucatto (IESP-UERJ) - A linha global de cor: raça, racismo e relações internacionais
Renata Braga (UFABC) - “Eu sou Atlântica”: a articulação transnacional do movimento de mulheres negras na América Latina

Debatedores: Carlos Machado (UNB) e Meyre Teixeira (RI/UFF)
Mediação: Bernardo Afonso (RI/UFF)

➡Mesa 2:
14:00h – 16:00h: Movimentos Sociais e Participação Política

Ana Claudia Cruz da Silva (UFF) – Coletivos Negros, Movimentos e Resistência no Sul da Bahia
Cristiano Rodrigues (UFMG) – Protesto negro em tempos de desdemocratização: do institucional ao contestatório?
Rodger Richer (UNICAMP) - A questão racial na UNE (1999 - 2018)

Debatedor: Márcio André dos Santos (UNILAB)
Mediação: Dara Santanna (Direito UFF)

➡Mesa 3 :
16:00h -18h - Políticas Públicas e Saúde da População Negra

Jaciane Milanezi (UFRJ) - Cadastradas difíceis no Sistema Único de Saúde: a governança da reprodução de mulheres negras no Rio de Janeiro
Layla Carvalho (UNILAB) – Justiça reprodutiva e Zika: caminhos impossíveis para mulheres negras em Pernambuco

Debatedora: Veronica Daflon (UFF)
Mediação: Lara Miranda (Negra- UFF)

Coffe Break

➡Mesa 4 :
18:00h – 20h segurança pública, racismo institucional e violência

Paulo Ramos (USP) - Gramática negra da luta contra a violência policial
Flavia Medeiros (UFF) Política de Segurança Pública, Drogas e Racismo
Juliana Vinuto (UFF): Silenciamento do racismo institucional na privação de liberdade

Debatedora: Luciane Soares Silva (UENF)
Mediação: Charlene Soares (PPGS- UFF)

Apresentação Artística: Falcão – Poesia falada - Slam


Segundo dia 30/8/2019 -

➡Mesa 1:
10:00 h – 12:00: Democracia e a questão racial

Huri Paz (Sociologia / UFF) – Assassinatos de políticos no Rio de Janeiro – um recorte de raça e gênero
Filipe Alves (Ciências Sociais UFF) - Articulando raça, gênero e sexualidade na política parlamentar
Rebecca Vieira (PPGSA/UFF) – Participação, mobilização e protesto: o caso do fórum de mulheres negras em Niterói.

Debatedor: Márcio André dos Santos (UNILAB)
Mediação: Ariel Nascimento (Negra/UFF)

➡Mesa 2:
14h – 15:30h: Raça e representação política:

Edilza Sotero (UFBA) : Representação negra no Estado Novo
Natália Neris (USP) : A questão racial e a constituinte
Martvs das Chagas. (Conselho Curador da FPA) – Raça e o Partido dos Trabalhadores

Debatedora: Flavia Rios (UFF)
Mediação: Emerson Luã (Negra/UFF)

➡Mesa 3:
15:30h – 17:30h: Desigualdades Raciais e eleições
Fabio Nogueira (UNEB) - Campanhas eleitorais e candidaturas negras em Salvador – BA
Carlos Machado (UNB) – Raça, representação e limites das eleições brasileiras
Wescrey Portes (IESP) – Sub-representação Política: a experiência eleitoral de candidaturas negras no Rio de Janeiro
Danusa Ester Gomes (UFF) : Representação da mulher negra na ALERJ: barreiras de classe, gênero e raça

Debatedora: Andreia Lopes (Unirio)
Mediação: Amanda Santos (PPGS/UFF)

Coffe Break

➡Mesa de Encerramento – 17:30h - 19:30h

Carlos Alberto Medeiros (UFRJ)
Verônica Lima (Câmara Municipal de Niterói)
Luiz Campos (IESP-UERJ)

Debatedora: Raquel Guilherme de Lima (UFF)
Mediação Dandara Vicente (PPGS/UFF)


 

Segunda, 26 Agosto 2019 17:10

XIII Jornada do PPGA UFF

Os alunos da pós graduação em Antropologia da Universidade Federal Fluminense realizam,  entre os dias 11 e 14 de novembro, a XIII Jornada PPGA UFF, intitulada Reflexões Antropológicas: contribuição e desafios na construção de saberes.

Mais informçaões acesse a página do evento: https://www.jornadappgauff.com/

 

GTs da Jornada

GRADUAÇÃO

GT01. Adversidades no Fazer Antropológico e Disputas Epistêmicas

coordenado por: Hugo Virgilio de Oliveira (UFF); Theodoro de Carvalho Teles (UFF)

GT02. Justiça e Segurança Pública

coordenado por: Rebeca Sophia Lima Azeredo (LAESP/UFF); Ana Claudia Amaral Brito (UFF)

GT03. Antropologia e Cinema: a consubstancialidade das relações de gênero, diversidade sexual, raça/etnia e classe

coordenado por: Alan de Jesus Ferreira (IFG); Helio Simplicio Rodrigues Monteiro (IFG)

GT04. Gênero, raça e sexualidade: a construção dos corpos negros a partir de uma perspectiva interseccional

coordenado por: Fillipe Alexandre Oliveira Alves (UFF); Lara Prata Miranda (UFF)

PÓS-GRADUAÇÃO

GT05. Antropologia, meio ambiente e saberes tradicionais 

coordenado por: Sabrina Soares D' Almeida (INCT/InEAC/UFF e Cebrap); Yolanda Gaffree Ribeiro (PPGA/UFF e INCT/InEAC/UFF)

GT06. Imagens, memórias e lutas sociais:  possibilidades da antropologia visual  como ferramenta de pesquisa e aproximação em contextos de conflito

coordenado por: Ana Priscila Rezende de Carvalho (PPGA-UFF); Aiano Bemfica Mineiro (PPGCOM - UFMG)

GT07. Etnologia indígena e estudos afro-brasileiros. Concepções de identidade, etnicidade, cosmovisão, memória e território

coordenado por: Queli Baptista (UFF); Marina Santos De Miranda (UFF)

GT08. Cristianismo e espaço público: aspectos sociais e políticos

coordenado por: Lívia Rabelo (UFRJ); Ramon Teixeira da Silva (UFRJ)

GT09. Entidades espirituais, materialidades, agenciamento e experiências sensíveis

coordenado por: Cledisson Geraldo dos Santos Junior (UFRRJ); Dayanne da Silva Santos (UFRGS)

GT10. O real e o construído: a problematização da dicotomia natureza-cultura e suas derivações sob a ótica de uma virada ontológica

coordenado por: Raphael Gouvêa Rompinelli (UFJF); Rafael Siqueira Machado (UFJF)

GT11. Rituais: Simbolismos e Materialidades 

coordenado por:  Igor Rolemberg (PPGAS/MN/UFRJ); Lucas Bártolo (PPGAS/MN/UFRJ)

GT12. Educação, patrimônio cultural, reconhecimento e a valorização das diferenças étnicas

coordenado por: Reinaldo da Silva Guimarães (PUC Rio); Rafael da Silva dos Santos (CEFET); Luciene Gustavo Silva (Anhanguera)

GT13. Etnografias  nas instituições escolares relações étnico-raciais em perspectiva

coordenado por: Maria Célia Barros Virgolino Pinto (UFPA); Patrício Carneiro Araújo (UniLab)

GT14. Entre o público e o privado: a casa como espaço de moradia, memória, sociabilidades e disputas

coordenado por: Amana dos Santos Nesimi (UFF), Caroline Martins de Melo Bottino (UFF)

GT15. Sociabilidades urbanas: pesquisando formas de se viver e experienciar as cidades

coordenado por: Ana Carla de Oliveira Pinheiro (UENF); Carine Lavrador de Farias (UENF) 

GT16. Gênero, poder e espaço

coordenado por: Bárbara Cardoso (UFF); Camilla Araújo (UFF); Thuani Queiroz (UFF)

GT17. Por uma antropologia das práticas, dos saberes e das sensibilidades no campo da segurança pública

coordenado por:  Marcos Verissimo (UFF); Astrid Johana Pardo (CEDERJ-CECIERJ); Betania Almeida (UFF)

GT18. Profissionais da segurança pública e do mundo direito: práticas, moralidades e saberes

coordenado por: Victória Brasiliense de Castro Pires (PPGSA-UFRJ); Perla Alves Bento de Oliveira Costa (PPGSD-UFF) 

GT19. Sociabilidades e dinâmicas em ambientes virtuais, novas tecnologias e vida offline

coordenado por: Pedro Ruback da Silva (PPGA-UFF); Karina de Paula (PPGA-UFF)

GT20. A antropologia e a questão das “drogas”: controles, circuitos, movimentos, rituais e práticas

coordenado por: Yuri J. de P. Motta (UFF); Gabriel Borges da Silva (UFF)

GT21. Antropologia do Poder e da Política

coordenado por: Hully Guedes Falcão (InEAC-UFF); Gabriela de Lima Cuervo (InEAC-UFF)

GT22. Questões em Antropologia Econômica

coordenado por: Rômulo Bulgarelli Labronici (PPGA / InEAC-UFF); Fábio Medina (PPGA/UFF)

GT23. Práticas Contemporâneas de Troca, Produção e Consumo

coordenado por: Giselly Martins da Horta (PPGA-UFF); Christian Queirolo Thorstensen (PPGA-UFF)

GT24. Discursos, práticas e representações dos atores jurídico-policiais no atual contexto das políticas de acesso à justiça, administração institucional de crimes e conflitos, e promoção da cidadania

coordenado por: Michel Lobo Toledo Lima (Universidade Veiga de Almeida - UVA e INCT-InEAC); Vera Ribeiro de Almeida dos Santos Faria (INCT-InEAC)

GT25. Administração de Conflitos e Sistema de Justiça Criminal

coordenado por: Izabel Saenger Nuñez (UFF); Marcelo da Silveira Campos (UFGD); Bóris Maia (UFF)

GT26. Entre o local e o global: Oriente Médio e suas diásporas

coordenado por: Ana Clara Alves de Oliveira (PPGA-UFF); Ana Maria Gomes Raietparvar (PPGA-UFF); Júlio D`Angelo Davies (PPGA-UFF)

 

Nessa sexta 23 de agosto de 2019,  acontece na OAB-RJ,  a III Reunião Ordinária da Comissão de Defesa do Estado Democrático de Direito (CDEDD), e que contará com a participação do antropólogo e coordenado do INCT/INEAC Roberto Kant de Lima. 

O evento gratuito, vai de 9 da manhã às 19h e acontece no Plenário Evandro Lins e Silva - OAB/RJ - Avenida Marechal Câmara 150, 4º andar.

 

Confira abaixo toda a programação do evento e outros detalhes da atividade.

Programa

8h30 - Credenciamento 

 

9h - Abertura

Luciano Bandeira - presidente da OAB/RJ

Luis Guilherme Vieira - presidente da CDEDD

 

9h30 - Painel 1 - Delação premiada: histórico doutrinário

Maria Lúcia Karam

Juarez Cirino dos Santos

 

11h - Painel 2 - Delação premiada e seu necessário procedimento criminal

Márcio Barandier

André Nascimento

Geraldo Prado

 

12h30 - Intervalo

 

14h - Painel 3 - Delação premiada e o papel ético dos advogados

Fernanda Prates

Roberto Kant de Lima

Nélio Machado

 

15h30 - Painel 4 - Delação premiada e sua jurisprudência nos tribunais superiores

Antonio Saldanha Palheiro - ministro do STJ

Sebastião Reis - ministro do STJ

Data e hora

23 AGO 2019
9h às 19h

Data de término

23 AGO 2019

Local

Plenário Evandro Lins e Silva - OAB/RJ
Avenida Marechal Câmara 150, 4º andar

Valor

Gratuito

Mais informações

(21) 2730-6525
 
 
 
 

O nosso site reproduz aqui o artigo da socióloga Jacqueline Sinhoretto (UFSCAR), pesquisadora também vinculada ao INCT/INEAC,  publicado no blog da Folha de São Paulo  (https://facesdaviolencia.blogfolha.uol.com.br/2019/08/18/na-seguranca-as-opcoes-ideologicas-explicam-mais-que-o-dinheiro/).

Na segurança, as opções ideológicas explicam mais que o dinheiro

 

Por Jacqueline Sinhoretto*


Se há um consenso no campo da segurança pública é que não faltou investimento nas polícias, no Judiciário e no Ministério Público neste século. Os governos investiram, atenderam demandas por novos equipamentos e tecnologias, priorizaram a área. Houve investimento em formação de recursos humanos e meios técnicos.
No entanto, os resultados colhidos, de modo geral, não reduziram o medo, não pouparam vidas, não enfraqueceram o crime organizado, a não ser em projetos localizados no tempo e no espaço.
E, no momento de crise orçamentária, segurança e justiça criminal precisam de profunda discussão. Custam muito caro para um resultado que a maioria considera insatisfatório. O atual movimento de redução de alguns índices criminais no país todo não pode servir de válvula de pressão para fugirmos do debate sobre novos rumos para a área.
Até aqui, o investimento em segurança e justiça criminal apostou todas as suas fichas em duas tecnologias: policiamento ostensivo e encarceramento. E, como tecnologias sociais, sempre há outras soluções possíveis, que podem ser mais racionais e efetivas a depender de quais são os problemas a resolver.
Não se trata de recusá-las por princípio. A discussão aqui não é ideológica. As tecnologias da ostensividade e do encarceramento servem para resolver um conjunto restrito de problemas. O policiamento ostensivo é uma ferramenta para lidar com delitos que ocorrem nas ruas, em grandes aglomerados, onde há previsibilidade de condutas: colocam-se mais policiais nos locais e horários em que crimes patrimoniais são mais frequentes.
O encarceramento é uma tecnologia disciplinar que atende à necessidade de isolar pessoas por tempo determinado para que não cometam crimes enquanto estiverem detidas. Sua função ressocializadora ou de reforma moral nunca foi comprovada em nenhum lugar, e os projetos de reforma da prisão surgiram historicamente quase junto com a prisão como a conhecemos.
No Brasil, cadeias superlotadas, em que estão presas pessoas que não cometeram crimes violentos, são os locais em que o crime organizado se articulada (ao invés de ocorrer o contrário). As prisões brasileiras são um ambiente de violência extrema, que dinamizam a violência também para fora delas.
Como tecnologias têm funcionalidades, têm também custos e efeitos adversos. Os custos sociais do policiamento ostensivo são bem documentados. O principal deles é o tratamento discriminatório de grupos sociais, que nasce da probabilidade de que naquele grupo exista um número maior de delinquentes.
No mundo inteiro, como no Brasil, o policiamento ostensivo concentra-se em grupos de jovens, negros, moradores de rua e toda sorte de outsiders, como usuários de drogas, migrantes, estilos de vida alternativo. Ao trabalhar com probabilidades e vigilância de grupos e áreas, acaba por reforçar estigmas e discriminações. Também é um efeito desta tecnologia criar um distanciamento social e de confiança entre os grupos discriminados e a polícia.
No caso brasileiro, além do policiamento ostensivo produzir tratamento discriminatório, ainda está aliado às mais altas taxas de letalidade policial do mundo, o que também se reverte em alta exposição dos trabalhadores da segurança à violência.
Se essas tecnologias são limitadas e oferecem efeitos colaterais perversos, como a retórica belicista de Wilson Witzel, entre outras, nos faz lamentar mortes atrás de mortes no Rio de Janeiro, por que as políticas de segurança e justiça insistem tanto em reforçar essas respostas problemáticas?
Aí entra o caráter político-ideológico das opções políticas tomadas pelos governantes e pelas lideranças corporativas de policiais, juízes e promotores. Não importa se prender mais não resolve ou se piora o problema, se policiamento ostensivo produz tratamento discriminatório ou se as taxas de crimes aumentam. O remédio que as corporações receitam é sempre continuar expandindo o uso dessas tecnologias para todo e qualquer problema de insegurança e injustiça. Entramos em um looping que parece não ter fim mas que nos afasta de soluções efetivas e eficientes de redução de todas as violências.
Compreender esse quadro, suas causas e encontrar soluções alternativas têm sido o trabalho dos centros de pesquisa acadêmicos. A Universidade tem um papel central na agenda de reformas democráticas do Estado. E, neste contexto, para impulsionar o debate de ideias, resultados e soluções, uma centena de pesquisadores se reunirá nesta semana na UFSCar, entre os dias 20 e 22, para o “Seminário Violência e Administração de Conflitos”.
O evento ocorre num momento paradoxal: precisamos do desenvolvimento de tecnologias de redução das múltiplas violências e a pesquisa nas universidades está ameaçada por cortes de verba e perseguição ideológica. A inteligência e as soluções racionais são desvalorizadas. As lideranças políticas e corporativas se promovem com promessas ilusórias de soluções fáceis.
As universidades, que podem contribuir para a reflexão técnica sobre os rumos da segurança pública no Brasil, correm o risco de ter suas atividades paralisadas por decisões ideológicas e autoritárias. Os bolsistas estão em desespero. Bem-vindos ao drama.
Jacqueline Sinhoretto, professora de Sociologia da UFSCar e coordenadora do GEVAC (Grupo de Pesquisa sobre Violência e Administração de Conflitos).

O site do INCT/INEAC reproduz aqui o artigo da antropóloga e cientista política Jacqueline Muniz para o BRASIL DE FATO (https://www.brasildefato.com.br/2019/08/19/opiniao-or-as-mortes-estao-sim-na-sua-conta-governador-wilson-witzel/).

 

As mortes estão sim na sua conta, governador Wilson Witzel

Jacqueline Muniz responde ao governador do RJ sobre responsabilidade nas mortes decorrentes de intervenção policial

Jacqueline Muniz*
 

Wilson Witzel, como um governador pode fingir não saber que ele é o comandante em chefe das polícias estaduais, responsável pelas finalidades e resultados da ação policial? Como um doutorando em ciência política** pode desconhecer que a capacidade coercitiva da polícia materializa as decisões do governante? Como um político pode omitir que a POLÍCIA É A (sua) POLÍTICA EM ARMAS? Como pode um político estudante de política performar como o exterminador do futuro ao bravejar seus ditos contra a bandidagem e atuar como soldadinho da toy story diante das graves consequências dos feitos policiais realizados sob seu comando? 

Que fique bastante claro. Compete ao governador autorizar determinados armamentos e alguns de seus modos de uso. E isto corresponde à sua proposta, implícita ou explícita, de segurança e direitos humanos que seguirá sempre aberta ao questionamento público. É o seu projeto de força para a polícia que comunica à sociedade os fins, meios e modos da sua política de segurança, sob a qual se é inevitavelmente responsável.

As mortes estão sim na sua conta, governador Wilson Witzel***. Esta fatura trágica é sua e não há como empurrar os corpos dos jovens mortos para longe do Palácio da Guanabara.  Eles permanecerão eternamente aqui na nossa memória e lá dentro de sua consciência, mantendo vivas a sua culpa moral, a sua indigência legal e a sua irresponsabilidade política. Estas juventudes interrompidas, somadas as muitas outras existências destruídas por suas palavras inconsequentes e de efeito letal, são muito mais que estatísticas frias. Elas formam o seu cordão de isolamento, a sua prisão sem grades que manterá sua vida pública sob cerco de tanta insegurança e letalidade produzidas.

*Jacqueline Muniz é professora do Departamento de Segurança Pública - Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos (InEAC) da Universidade Federal Fluminense (UFF).

**Wilson Witzel (PSC) realizou a qualificação de sua tese de doutorado em Ciência Política na UFF na última quinta-feira (5).

***Em declaração na última sexta-feira (16), o governador disse que a morte dos jovens estariam na conta dos defensores de direitos humanos.

Edição: Vivian Virissimo

O site do INCT INEAC reproduz aqui o artigo "Acesso a direitos fundamentais, a regulação da maconha", publicado no BLOG DA CIÊNCIA - https://blogs.oglobo.globo.com/ciencia-matematica/post/acesso-direitos-fundamentais-regulacao-da-maconha.html  e escrito em conjunto pelos antropólogos Roberto Kant de Lima, Coordenador do INCT- Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos, Frederico Policarpo Mendonça Filho e Marcos Veríssimo, pesquisadores do INCT-InEAC . 

 

Acesso a direitos fundamentais e à saúde no Brasil: uma discussão em torno da regulação da maconha

 

Esforços entre países para o controle de substâncias psicoativas podem ser verificados desde o final do século XIX no assim chamado mundo ocidental, mas foi a partir da década de 1960 que se consagrou, por meio de tratados transnacionais, o modelo político atual de controle sobre determinadas substâncias contemporaneamente denominadas de “drogas”. Em 1961, na Convenção Única da Organização das Nações Unidas sobre Drogas; depois em uma versão atualizada pelo Protocolo sobre Psicotrópicos, de 1971; e, finalmente, pela Convenção de Viena, de 1988. Esses documentos servem de base para classificar as substâncias entre lícitas e ilícitas, condenando qualquer uso que não seja médico. Esse modelo é chamado de “Proibicionismo”, e suas ações são atualizadas tomando como referência o paradigma médico-jurídico: o campo biomédico classifica as substâncias entre as que têm e não têm potencial uso terapêutico e o campo do direito determina as leis para a produção, circulação e consumo e as sanções para os infratores. Esses são os princípios gerais que regem os acordos internacionais que, sob os auspícios da ONU, contam com a adesão dos países membros. Estes, por sua vez, adotam regulamentos domésticos informados por esses princípios.

 

Neste curto espaço, gostaríamos de provocar uma reflexão sobre esse tema, aproveitando que uma nova lei de drogas foi sancionada (lei 13.840/19) e ainda está prevista para esse ano a discussão sobre mais dois pontos importantes. Primeiro, a retomada do julgamento sobre a criminalização do porte de drogas para consumo próprio pelo Supremo Tribunal Federal; segundo, em decorrência da aprovação da ANVISA de propostas de resolução para regulamentar o cultivo da maconha (Cannabis sativa L.) para fins medicinais. A consulta pública sobre essas propostas está aberta. Esperamos, dessa forma, contribuir para o debate.

Nossa reflexão parte de pesquisas de caráter etnográfico que realizamos em diferentes cidades e países, nos possibilitando o exercício da perspectiva comparativa e a construção de parâmetros contrastivos. Desse modo, tivemos oportunidade de observar empiricamente a premissa segundo a qual embora o “Proibicionismo” tenha pretensões universais de controle das drogas, suas consequências são sentidas em nível local. Portanto, para compreendermos seus efeitos, implicações, e eventualmente alguns paradoxos, é preciso levar em conta as especificidades das formações sócio históricas de cada país e observar as práticas de administração dos conflitos em cada contexto.

Para exemplificar essas questões, gostaríamos de pontuar alguns eixos contrastivos observados em nossas pesquisas nos EUA e na Argentina com relação ao uso da maconha, tomando como base resultados de estudos desenvolvidos em pesquisas que resultaram em teses de doutorado em antropologia, feitas no âmbito do Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos (INCT-InEAC), e já publicadas em livros.

No primeiro caso, dos EUA, nos últimos anos tem sido verificada, em alguma medida, no caso da maconha, a contestação da aplicação irrestrita do modelo proibicionista em favor de formas de regulação mais liberalizantes no que concerne aos usos terapêuticos e sociais desta planta classificada como “droga”. O modelo federativo daquele país permite que, embora proibida ao nível federal, diferentes estados que compõem a nação pudessem construir, em arranjos variados, normativas legais e legitimadas socialmente onde o cultivo, circulação e o emprego de terapias à base de maconha são permitidos aos cidadãos.

Através de pesquisas de campo nas cidades do Rio de Janeiro, no Brasil e em San Francisco, Califórnia, Frederico Policarpo observa que, embora o Brasil e os EUA tenham avançado na regulamentação em torno da maconha medicinal, esses regulamentos seguem direções distintas: enquanto nos EUA qualquer pessoa pode se tornar um paciente de maconha, no Brasil essa possibilidade é muito restrita, fazendo com que as formas de acesso legal à maconha sejam diversas. Assim, pudemos concluir que no contexto norte-americano é a maconha que vira remédio, enquanto no brasileiro é a pessoa que deve se enquadrar como paciente. Há que se considerar as consequências que daí decorrem..

No segundo caso, o argentino, o modelo proibicionista ainda prevalece, como no caso brasileiro. Mas isso não implica que a comparação entre as normativas legais entre esses dois países na América de Sul não indiquem seus contrastes. É o que se conclui a partir de trabalho de campo de Marcos Veríssimo nas cidades do Rio de Janeiro e de Buenos Aires, focado em descrever e interpretar as formas como, nestas duas cidades, grupos sociais e de ativismo político mais ou menos definidos dão forma àquilo que chamam de “cultura canábica”. Na capital argentina, a pujante edição de revistas com periodicidade mensal direcionadas a um público que cultiva e consome maconha, bem como a realização de campeonatos de cultivadores onde um jurado especializado escolha a erva campeã, são realidades que não encontram ainda paralelos no Brasil.

Em Buenos Aires, aparece em destaque a temática dos direitos individuais, das perspectivas tidas como garantidoras de direitos, em destaque o direito à privacidade, à intimidade, em suma, a ideia de que tudo aquilo que o sujeito faça, no âmbito privado, que não venha inequivocamente afetar terceiros, deve ficar fora da esfera penal e da capacidade coercitiva do Estado. Eis o terreno sólido no qual os artífices da “cultura canábica” procuram se alicerçar, o do direito à intimidade. Já no caso do Rio de Janeiro, marcado indelevelmente pela desigualdade jurídica dos regimes monárquicos escravagistas do século XIX, esse pode ser um terreno bastante movediço. O direito à privacidade, como tudo que tem valor social e político em terras cariocas, é desigualmente distribuído entre os grupos que formam a sociedade. O efeito prático disso é que há os que podem fumar maconha mais tranquilamente amparados pela capacidade prática de exercer seu direito à privacidade, e há os que estão muito longe de poder fazê-lo, e por isso, não raro, sofrem arbitrariedades.

Nos caso do contraste com os EUA salta aos olhos, no Brasil, a necessidade de sujeição do paciente ao poder médico para ter acesso a seu “tratamento”; quanto à Argentina, também é evidente a dificuldade brasileira de reivindicar um “tratamento” jurídico uniforme, explicitando abordagens particularizadas do acesso a direitos fundamentais e à saúde pública. Isso se torna mais claro ainda quando se examinam números relativos a condenações por tráfico, que penalizam seletivamente usuários e traficantes de acordo com o status social dos envolvidos e não de acordo com as quantidades de droga em seu poder, encarcerando pequenos traficantes que vão se constituir na maioria da massa carcerária brasileira, que já ultrapassa 800 mil presos, dos quais 40% não possuem sentença de primeira instância.

Dessa maneira, pensamos que o debate agora estabelecido na sociedade e na pauta do jogo político em torno das formas de regulação da maconha no Brasil não pode carecer de uma perspectiva multidimensional, e que os estudos realizados na universidade podem aí contribuir de maneira decisiva.

 

O site do INCT INEAC reproduz aqui a matéria intitulada  "In Brazil, tough-on-crime approach packs prisons", publicada no Associated Press . A matéria traz as participações do antropólogo Roberto Kant de Lima, coordenador do INCT/INEAC e do cientista político Marcelo da Silveira Campos, pesquisador também vinculado ao INCT-INEAC.

A Associated Press é uma agência de notícias, fundada 1846 e uma cooperativa cujos proprietários são os jornais e estações de rádio e televisão norte-americanas que contribuem para a Associated Press.

Para ler a matéria no site da agência acesse https://apnews.com/c4f848f31e3b43c8b87f4ec2a4596455 

In Brazil, tough-on-crime approach packs prisons

August 1, 2019
 

RIO DE JANEIRO (AP) — Another burst of violence at an overcrowded Brazilian prison where dozens of inmates died has prompted promises of more prison cells and more guards, despite expert warnings that the strategy has been failing for decades.

A tough-on-crime vow last year helped Jair Bolsonaro win the presidency of Brazil, a nation plagued by gangs blamed for a string of mass-murder prison riots. No country has suffered more homicides in recent years and only two nations — the United States and China — have more people behind bars.

“Our concern and our priority are good people,” Bolsonaro said on Twitter while campaigning last year. “I’ve always said it: I prefer a prison full of criminals than a cemetery full of innocents. If space is missing, we build more!”

On Monday, a gang at the Altamira prison in northern Brazil attacked rivals within the walls and setting fire to a temporary cell block. Officials say 58 people were decapitated or asphyxiated by the fire. Four others apparently were strangled by other inmates in the aftermath as prisoners were being transferred to supposedly safer lockups.

Relatives of the victims were gathered outside the Altamira morgue for a third day on Thursday in hopes of recovering remains for burial. The forensic institute said it had released only 27 bodies. The other 31 either need DNA testing for full identification or families lacked required documentation to retrieve their bodies.

In response to the riot, state officials in Para pledged to build five new prison units to hold more than 2,000 inmates, and Gov. Helder Barbalho said over 1,000 new security agents will patrol prisons.

It’s an echo of the response to previous eruptions of prison violence.

“The truth is that Brazilian policymakers have long responded to the prison crisis by building more prisons, stiffening penalties,” said Robert Muggah, co-founder of the Igarape think tank in Rio de Janeiro. “The paradox is that the filling of Brazilian jails is not only costly and ineffective, it is strengthening the hand of organized crime.”

Reformers complain that the ill-controlled prisons essentially serve as schools for crime, forcing minor offenders into cooperation with murderous criminal cartels behind bars.

Brazil already has more than 720,000 individuals behind bars, according to official data from 2017. More recent independent estimates have the current incarcerated population at over 800,000 — more than triple the number in 2000.

The country has continued to build more prisons to try to keep up with its ever-growing incarcerated population. The national prison department recently announced that about 20,000 new cell spaces would be created by the end of the year. But it already faced a shortage of 302,758 cell spaces as of July 2017.

Para state’s prisons are 8,600 inmates over capacity, so the government’s vow to create 2,000 spots will only dent the problem.

Overcrowding has left prison guards severely outnumbered, struggling to keep control of inmates, and has repeatedly blamed as a key factor in Brazil’s recurring prison riots and massacres.

Two days of clashes in the neighboring state of Amazonas in May left 55 prisoners dead in four different prisons of the state’s capital, Manaus. In 2017, more than 120 prisoners died in another string of violent episodes that lasted several weeks, spreading to various states.

Bolsonaro came into office with a record of inflammatory statements. During the campaign, he suggested that “you cannot treat (criminals) as if they were normal human beings, ok?” And suggested police be given a freer hand to kill them: “If he kills 10, 15 or 20 with 10 or 30 bullets each, he needs to get a medal and not be prosecuted.”

That hard-line message has broad appeal in a country where, according to the independent Brazilian Public Security Forum, 63,880 people were killed in 2017.

But critics say prisons are being clogged by inmates arrested for small drug offenses — prisoners often recruited into far more serious crimes by prison gangs — and alternatives need to be found.

“The prison today is a deposit for the undesirable,” and not just serious criminals, said anthropologist Roberto Kant Lima, a professor at the Federal Fluminense University.

Nearly 30 percent of all inmates in Brazil were convicted — or are awaiting trial — on drug-related charges. Marcelo da Silveira Campos, also a researcher at the Federal Fluminense University said his studies found that at least half of those in Sao Paulo state were in prison for possessing less than 7 grams (a quarter ounce).

The leftist administration of President Luiz Inacio Lula da Silva tried to tackle the problem in 2006, passing a law that strengthened sentences for “traffickers” but including alternatives to prison for minor “drug users.”

In practice, however, it didn’t work. One key flaw, experts say, is that it did not mention a specific quantity of possession to differentiate drug users from traffickers, leaving it up to police officers, prosecutors and judges to decide.

“The law ended up being discretional, not objective,” Campos said, adding that too often users are prosecuted as traffickers.

This year, Congress passed a bill designed to further toughen penalties for traffickers and require users to undergo rehabilitation at private or religious centers. But that legislation again fails to specify the difference between trafficker and user.

 

A Revista DILEMAS publicou artigo do antropólogo João Vitor Freitas Duarte Abreu e do cientista político Pedro Heitor Barros Geraldo, ambos pesquisadores vinculados ao INCT-INEAC. O artigo analisa a transferência da Central de Audiência de Custódia do prédio do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro para a Cadeia José Frederico Marques em Benfica. Para tanto, enfatiza três aspectos: a) o deslocamento do serviço de justiça; (b) a dimensão pública da justiça; e (c) a compreensão da política de aprimoramento dos dispositivos de encarceramento. Os dados foram coletados em pesquisa de campo realizada entre junho de 2017 e maio de 2018. Audiências na cadeia pública restringem o acesso ao público. Além disso, essa mudança favoreceu a decisão de manter os custodiados presos produzindo um aperfeiçoamento do dispositivo de encarceramento.

Para ler a íntegra do artigo faça abaixo o download do PDF.

 

 

 

 
 

 

 

O site do INCT/INEAC reproduz aqui a entrevista dada pelo antropólogo Roberto Kant de Lima à revista POLÍTICA DEMOCRÁTICA, no site da Fundação Astrojildo Pereira - http://www.fundacaoastrojildo.com.br/2015/2019/07/29/autores-revista-politica-democratica-edicao-9/ e conduzida pelo antropólogo Luís Roberto Cardoso de Oliveira e  o advogado Renato Gallupo.

 

Política de justiça criminal atingiu mais os desiguais, diz Roberto Kant.

Medidas como a mudança proposta pelo presidente Jair Bolsonaro sobre a aquisição e o porte de armas, entre outras, beneficia “criminosos profissionais” em detrimento do cidadão comum, critica Roberto Kant de Lima.

 

 “A partir da Lava Jato, o protagonismo da tutela saltou para o juiz, que, articulado com as outras corporações, retoma a mesma ideia de se tornar agente público com visibilidade” O antropólogo Roberto Kant de Lima, coordenador do Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Administração Institucional de Conflitos (NEPEAC/PROPPI/UFF), e membro da Academia Brasileira de Ciência (ABC) – que há cerca de 20 anos faz pesquisa de campo em instituições judiciárias e policiais do Brasil e dos Estados Unidos – é o entrevistado especial da oitava edição da Revista Política Democrática Online, publicação mensal editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Cidadania (23). Kant, que também é professor titular aposentado do Departamento de Antropologia e professor aposentado adjunto do Departamento de Segurança Pública da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, é um crítico ferrenho da mudança proposta pelo presidente Jair Bolsonaro sobre a aquisição e porte de armas no Brasil. Ele cita como exemplo, a situação do Rio de Janeiro, onde a população já vive em um verdadeiro “faroeste”. “Vivemos um problema para cuja solução não se tomaram as devidas providências. São as milícias, mistura de operadores institucionais, da polícia, e pessoas que já saíram ou foram expulsas da polícia. A legislação vai, em minha opinião, legalizar esse faroeste, permitir que as pessoas tenham mais armas e munição em casa, legalmente”, critica. Para ele, o decreto que está no Congresso vai fortalecer a ideia de um poder não institucional. “Trata-se, no fundo, de legalizar uma situação que, pelas leis atuais, ainda é considerada de competência federal. E portanto, ainda sujeita a certos controles, como considerar ilegal a posse e o porte de arma sem licença. Isso poderá não ser mais possível no futuro. E quem tem mais interesse nisso não são os “cidadãos de bem”, mas criminosos profissionais, completa. Sobre temas como o papel do Judiciário, a Lava Jato e as denúncias da Vaza Jato, Roberto Kant avalia que “não tem sido fácil se conceber, juridicamente, no Brasil, a visão republicana da igualdade perante a lei, e do Judiciário como garantidor desses direitos ditos civis”. De acordo com o antropólogo, “nossa independência encontrou um país imperial, de brasileiros nobres e plebeus e imenso contingente de escravos, que não eram plenos sujeitos de direito, juridicamente chamados “semoventes”. “Todos se consideram como operadores de justiça. Quer dizer, cada um acha que está fazendo justiça, embora, muitas vezes, operando contraditoriamente. Mas, do seu ponto de vista, seja hierárquico ou igualitário, a justiça está sendo feita. E essa falta de diálogo, articulação e de consenso é que é o problema”, completa.

Confira, a seguir, trechos da entrevista do antropólogo Roberto Kant à Revista Política Democrática Online. Revista Democrática Online

(RD) – A legislação ora sob exame no Congresso sobre a aquisição e o porte de armas deverá fortalecer a segurança pública ou, ao contrário, promover o faroeste no Rio de Janeiro?

Roberto Kant (RK) – O Rio não vai se transformar num faroeste; já é. Vivemos um problema para cuja solução não se tomaram as devidas providências. São as milícias, mistura de operadores institucionais, da polícia e pessoas que já saíram ou foram expulsas da polícia. A legislação vai, em minha opinião, legalizar esse faroeste, permitir que as pessoas tenham mais armas e munição em casa, legalmente. Vai fortalecer a ideia de um poder não institucional. Trata-se, no fundo, de legalizar uma situação que, pelas leis atuais, ainda é considerada de competência federal. E, portanto, ainda sujeita a certos controles, como considerar ilegal a posse e o porte de arma sem licença. Isso poderá não ser mais possível no futuro. E quem tem mais interesse nisso não são os “cidadãos de bem”, mas criminosos profissionais.

RD: O embate político e ideológico travado pela internet parece ter transposto para o plano do Judiciário posições políticas extremadas. Como o sr. vê essa conjunção entre justiça e política?

RK: Em 2016, publiquei com Glaucia Mouzinho um artigo na Revista Dilemas, de análise desse fenômeno, desde a prisão coercitiva de Lula. 

Historicamente, desde o Império, a população brasileira tem estado dividida em status jurídicos desiguais. Nobres, plebeus e semoventes – esses últimos, os escravos, equiparados aos animais domésticos ou domesticados – estavam todos sujeitos ao processo penal, embora de maneira desigual. A política de justiça criminal atingiu mais os segmentos desfavorecidos da população. Basta lembrar que a maior parte das pessoas presas – muitas sem sentença definitiva – é de pequenos usuários de drogas que são encarcerados como se fossem traficantes. A polícia, com essas prisões, a maioria em flagrante e, portanto, sem trabalho investigativo da Polícia Civil, tenta mostrar trabalho a serviço da sociedade, mantendo a ordem; só que os capitalistas do crime e os grandes corruptores seguem intocáveis. A partir do “Mensalão”, houve uma primeira tentativa de estender o poder de punição às classes mais favorecidas. Mediante um trabalho hercúleo, o ministro Joaquim “ Barbosa deixou claro ser possível tratar de punição no nível do Supremo Tribunal Federal como instância de instrução do processo. O desafio era fazer frente ao grande problema da prerrogativa de função, privilégio no qual se confunde o funcionamento da instrução judicial na primeira instância – interrogatório de réus e testemunhas, perícias etc. – com o exame de recursos da segunda instância e de instâncias superiores. A Lava Jato é, em grande medida, questionada por conta dos defeitos constantes de inquéritos policiais, que permitem muitas vezes anulações e prescrições de processos criminais. A lerdeza do andamento ordinário dos processos, da primeira instância às instâncias superiores, também abre a possibilidade de interferências seguidas nos processos, até sua conclusão pela autoridade do juiz/juízes. O processo penal desconfia do acordo entre as partes, e diz a doutrina que mesmo que as partes estejam de acordo, o juiz pode continuar pesquisando, para descobrir a verdade real. Esses processos envolvem corporações – Polícia Federal, Ministério Público Federal, a Magistratura Federal, a Defensoria Pública Federal e a Advocacia – que não atuam, em geral, em consonância, mas competem por prioridades na execução de seus trabalhos. Por exemplo, aqui no Rio, a Operação Lava a Jato é desenvolvida pela Justiça Federal: não incorpora Polícia Federal porque cuida do combate a drogas. Quanto à atuação do juiz, tem-se de registrar que ele precisa autorizar as diligências solicitadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Tem de inteirar-se das justificativas da investigação proposta. Daí ser inevitável que o juiz se envolva no processo investigativo, arranhando a tradição brasileira, segundo a qual o juiz deve se manter imparcial e equidistante em relação às partes. As críticas não levam em conta que, desde a Constituição de 1988, nada mudou na prática. O processo penal é uma “ciência” do direito processual, que não se comunica automaticamente com a “ciência” do direito constitucional. Isso cria uma ambiguidade, sob a qual se trabalha o tempo todo aqui no Brasil, especialmente no direito processual penal, que tanto pode ser acusatório e presumir a inocência, quanto se desenvolver, desde o inquérito policial inquisitorial, de maneira a presumir a culpa do acusado. Ora evocam-se a Constituição e seus direitos fundamentais para defender as pessoas, ora esses direitos constitucionais não têm a oportunidade de serem evocados e/ou aplicados. A possível contradição entre esses direitos fundamentais e as práticas processuais ordinárias não é exclusiva do processo penal. O professor Roberto da Matta escreveu há 40 anos artigo seminal, intitulado “Você sabe com quem está falando?”, em que indicava sermos uma sociedade com representações igualitárias da lei, a ser aplicada universal e uniformemente aos indivíduos, e termos também uma representação da sociedade extremamente hierarquizada, que se espelha nos privilégios processuais que estão aí desde sempre. Para citar apenas um exemplo, entre vários, destaca-se a prerrogativa de função, de pessoas que estão próximas do Estado e, por isso, têm direito ao processo ser iniciado pelas instâncias superiores. Estima-se em 42 mil o total de pessoas nessa situação. Ou seja, as pessoas são tratadas processualmente não em função do delito que são acusadas de cometer, mas de acordo com seus status social. Várias tentativas já foram feitas para rever essa situação.

RD: A despeito do questionamento pelo ministro Sérgio Moro da autenticidade dos fatos revelados pela Vaza Jato, qual é, a seu ver, a implicação disso para a justiça, no paradigma do Estado Democrático de lei, instituído pela Constituição de 1988?

RK: A primeira consequência é revelar à população como funciona o processo penal. A Constituição mudou os parâmetros que estavam estabelecidos até então, sobretudo com relação ao devido processo legal, da igualdade entre as partes do processo. A Constituição faz parte da ciência do direito constitucional, e o processo é definido pela ciência do processo penal que permanece meio inquisitorial, meio acusatorial. Essas duas “ciências” nem sempre conversam, a não ser quando é conveniente e possível a “conversa” ser levada ao Supremo Tribunal Federal. Se permanecer nas instâncias inferiores, depende do juiz, que poderá se guiar pelo texto da Constituição ou pelos termos do processo. Não se substituiu o Código de 1941, está-se tentando desde há muito fazer um novo Código de Processo, e essa ambiguidade não deixou que esse código tivesse nova versão de 1988 para cá. Está mais do que na hora de uma discussão aprofundada a respeito.

RD: O sr. quer dizer que, aparentemente, os últimos acontecimentos da Lava Jato nada mais fizeram do que desnudar uma situação de ambiguidade estrutural, presente de longa data. Esse desnudamento tem ocasionado situação de mal-estar na sociedade, fonte de demanda por mudanças. Mas nem sempre as mudanças são virtuosas; propõe-se, por exemplo, o fechamento do STF. Haveria alguma saída virtuosa dentro do Estado Democrático de direito para essa situação de ambiguidade que os vazamentos da Lava Jato estão, digamos assim, mostrando.

RK: Da Matta se opôs (1979) às teorias então majoritárias, de que o Brasil estava inexoravelmente se modernizando, se industrializando, se urbanizando. E que, portanto, o conflito de classes iria surgir e orientar nosso futuro para longe do que se chamava – e ainda se denomina pejorativamente – de clientelismo, patronagem, etc. Era uma aplicação original das teorias do francês Louis Dumont, para quem a sociedade brasileira se representava como ambígua, porque ora os segmentos sociais eram desiguais e complementares – vivendo em harmonia em uma hierarquia holística – ora era um conjunto de indivíduos iguais que se opunha, orientado por princípios igualitários e individualistas. Essa ambiguidade estrutural da sociedade também se estende para nossa cultura jurídica, especialmente nesta discussão jurídico-processual. O papel do cientista social, no caso, o meu e o de meus colegas pesquisadores no Instituto de Estudos Comparados de Administração de Conflitos, é lidar com essas questões de maneira transparente. O mundo jurídico constrói seu saber com fundamento na lógica do contraditório, regida pelo argumento da autoridade, ambiente em que uns estarão de um lado, e outros, de outro. Em caso de discórdia, caberá ao tribunal resolver o problema. Só que ele o faz individualmente. Mas não se trata de um problema individual. Não é um problema do Lula, não é um problema das pessoas, é um problema estrutural da lei processual e de suas práticas naturalizadas. Para mudar isso, as forças sociais, os movimentos sociais etc., inclusive os juristas interessados é que tem que se mobilizar.

RD: Com base em suas pesquisas, como o sr. vê a repercussão nas áreas do Judiciário e da segurança pública, desses aspectos relacionados às liberdades?

RK: Meu colega Luís Roberto Cardoso de Oliveira tem um trabalho interessante e original sobra a matéria. Fala da convivência de duas ideias de igualdade no Brasil: a igualdade jurídica dos semelhantes a nós, que vale para aqueles que são iguais a nós, e, portanto, os “diferentes” são desiguais e não devem ter os mesmos direitos, ideia de igualdade do antigo regime; e outra ideia republicana, da igualdade em direitos dos diferentes. Uma representação de igualdade vê a outra como sendo injusta e desigual. Rui Barbosa defendia que a “regra da igualdade é aquinhoar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam” (1920). Considerava essa representação da igualdade como uma desigualação proposta pelo direito, que se opõe à desigualação produzida pelo mercado. Mas, nas revoluções burguesas, instituiu-se outro paradigma: a ideia de que o direito tem de igualar formalmente os diferentes indivíduos com os mesmos direitos, diante da inevitável desigualação operada pelo mercado. Não tem sido fácil se conceber, juridicamente, no Brasil, a visão republicana da igualdade perante a lei, e do Judiciário como garantidor desses direitos ditos civis. Nossa independência encontrou um país imperial, de brasileiros nobres e plebeus, e imenso contingente de escravos, que não eram plenos sujeitos de direito, juridicamente chamados “semoventes”. Todos se consideram como operadores de justiça. Quer dizer, cada um acha que está fazendo justiça, embora, muitas vezes, operando contraditoriamente. Mas, do seu ponto de vista, seja hierárquico ou igualitário, a justiça está sendo feita. E essa falta de diálogo, articulação e de consenso é que é o problema. Não é o direito que desiguala, é o mercado, todo mundo vai se desigualar de acordo com sua participação no mercado. No nosso caso, o direito desiguala antes do mercado e, por isso, favorece cartéis e monopólios, e o mercado tem de pedir licença a ele para exercer seu poder desigualador.

RD: Como o sr .vê o papel político exercido por membros do Ministério Público? Há exorbitância no papel que desempenham?

RK: Estudos recentes revelam que os membros do Ministério Público procuram um protagonismo, registrado na Constituição de 1988, que se define em deixarem de ser meros acusadores e passarem a ser também “fiscais da lei”. Nessa passagem, o Ministério Público se erige com um tutor da sociedade brasileira, podendo intervir e atuar em defesa daquilo que a sociedade ou mesmo grupos e indivíduos não se importam em atuar. Esses agentes públicos desejam explicitamente tutelar a sociedade brasileira. Trata-se de uma tutela que representa apenas mais uma aplicação da regra da igualdade e do sentido de justiça que, como já disse, é ambíguo no Brasil. E com isso, eles passam a rivalizar com a Magistratura, que seria meramente reativa e não teria protagonismo. Até o Mensalão, até a Lava Jato – lembrando que o ministro Joaquim Barbosa era do Ministério Público, do Rio –, esse protagonismo estava majoritariamente com o Ministério Público. A partir da Lava Jato, o protagonismo da tutela saltou para o juiz, que, articulado com as outras corporações, retoma a mesma ideia de se tornar agente público com visibilidade. Há uma competição entre o Ministério Público e a Magistratura, especialmente na órbita federal. A Magistratura no topo da pirâmide porque é ela que decide. Os juízes da Lava Jato se apropriaram dessa visibilidade pública, de acordo, aliás, com a própria Constituição de 1988, que lhes deu essa liberdade de optar entre serem acusadores e fiscais da lei.

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